CONSULENTE: CONSELHO DE REPRESENTANTES DA FECOMBUSTÍVEIS ATRAVÉS DO PRESIDENTE DO SINDICATO DO PARÁ, SR. OVÍDIO GASPARETTO

 PARECER

 Desde logo, esclareço que não há uma uniformização da jurisprudência que permita assegurar se o posto é ou não responsável e por isso tem o dever de indenizar um cliente que venha a sofrer um assalto dentro da área do  posto,  ainda  mais  quando  se  tem  a  peculiaridade  do  saque  em  caixa eletrônico. Todavia, como será explanado, o entendimento que parece o mais adequado e que tem respaldo de julgado específico do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que em caso de evento roubo (quando há o furto de pertence mediante emprego de força ou grave ameaça – o que na linguagem usual é chamado de assalto), por se tratar de algo inevitável, se aplica a excludente de responsabilidade civil decorrente de caso fortuito externo.

 A questão posta em consulta é bastante complexa e comporta entendimentos para os dois lados.

 Pode parecer ilógico e injusto com o revendedor que se uma pessoa venha a sofrer um assalto depois de sacar dinheiro em uma caixa eletrônico instalado na rua não tenha quem responsabilizar pelo ocorrido. Ao passo  que  se  o  caixa  eletrônico  estiver  instalado  na  área  do  posto  de combustíveis o cliente assaltado pudesse cobrar do posto o prejuízo sofrido.

Todavia, infelizmente, parece claro que o judiciário vem transferindo para os agentes econômicos responsabilidades fundamentais do Estado,  como  é  o  caso  da  segurança.  Nessa  linha  de  raciocínio,  algumas decisões judiciais condenam os postos a ressarcir danos materiais e até morais ao cliente que foi assaltado na área do empreendimento, tendo como fundamento legal o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe que “o fornecedor de serviços responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços”.

 O entendimento seria de que ao oferecer estacionamento aos clientes, proporcionando comodidade e facilidade, o empresário capta sua confiança, fazendo com que este serviço constitua-se, na verdade, em uma alternativa a mais de atração à clientela. Entende-se que o preço pela guarda e segurança do veículo na área do estabelecimento comercial não é gratuito, pois caso não houvesse cobrança de estacionamento, ainda assim o preço estaria contabilizado no custo dos produtos comercializados e colocados à disposição dos clientes.

 Porém, mesmo que o entendimento acima estivesse correto, de qualquer forma o posto de combustíveis não detém meios de impedir a ocorrência de assaltos, o que o noticiário demonstra que ocorrem todos os dias em postos de combustíveis neste país. O cliente pode se sentir mais seguro indo em um caixa eletrônico instalado na área de um posto de combustíveis, mas sempre existirá risco de assaltos a qualquer hora do dia e da noite, seja em lugar aberto ou fechado, privado ou em área pública. O que varia é o grau do risco.

O Código de Defesa do Consumidor dispõe que (artigo 14 § 1°) “O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais, o modo de seu fornecimento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam e a época em que foi fornecido”.

Ora, se até em shopping centers, que são fechados e com controle de entrada e de saída de veículos, ocorrem assaltos. O que se dirá em relação aos postos de combustíveis que são abertos e onde não há controle de entrada e saída. Portanto, é um risco que razoavelmente se pode esperar a ocorrência de assaltos na área de um posto de combustíveis. O consumidor que optar em procurar um caixa eletrônico em um posto de combustíveis pode o fazer por diversos motivos, tais como a facilidade de estacionamento e a maior segurança. Todavia, sempre existirá o risco de assalto, razão pela qual a ocorrência desse tipo de crime não pode ser considerada como um serviço defeituoso por parte do posto de combustíveis.

Cabe ainda afirmar que a responsabilidade do fornecedor em reparar os danos causados aos consumidores, em decorrência de defeitos no serviço prestado, é objetiva, consoante o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, bastando para a sua configuração a ocorrência do ato ilícito, o dano sofrido pelo consumidor e o nexo causal. Referida responsabilidade, no entanto, é afastada, quando o dano decorrer de culpa exclusiva da vítima ou de terceiro (no caso o assaltante), nos termos do § 3° do mesmo dis positivo legal.

 De outra banda, o entendimento que se mostra mais adequado e que deve(ria) prevalecer no judiciário está exposto em elucidativo julgado do Superior Tribunal de Justiça que define que “tratando-se de postos de combustíveis, a ocorrência de delito (roubo)   a   clientes   de   tal estabelecimento, não traduz, em regra, evento inserido no âmbito da prestação   específica   do   comerciante,   cuidando-se   de   caso   fortuito externo,  ensejando-se,  por  conseguinte,  a  exclusão  de  sua responsabilidade pelo lamentável incidente.”

 Confira-se a ementa do acórdão:

 RECURSO ESPECIAL Nº 1.243.970 – SE (2011/0056793-5) RELATOR : MINISTRO MASSAMI UYEDA
RECORRENTE : FRANKLIN DE SOUZA ANDRADE E OUTRO

ADVOGADO : CAROLINE VALERIANO DA SILVA E OUTRO(S) RECORRIDO : POSTO SIQUEIRA CAMPOS I

ADVOGADO : JOSÉ RAIMUNDO MOURA GONZAGA EMENTA

RECURSO ESPECIAL – DIREITO CIVIL E  CONSUMIDOR – RESPONSABILIDADE CIVIL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – FORNECEDOR – DEVER DE SEGURANÇA – ARTIGO 14, CAPUT, DO CDC –  RESPONSABILIDADE OBJETIVA – POSTO DE COMBUSTÍVEIS – OCORRÊNCIA DE DELITO – ROUBO – CASO FORTUITO EXTERNO – EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE – INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR – RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.

I – É  dever do fornecedor oferecer aos seus consumidores a  segurança na   prestação   de   seus   serviços,   sob   pena,   inclusive,   de responsabilidade   objetiva,    tal    como    estabelece,   expressamente,   o próprio artigo 14, “caput”, do CDC.

II – Contudo, tratando-se de postos de combustíveis, a ocorrência de  delito (roubo) a clientes de tal estabelecimento, não traduz, em regra, evento inserido  no  âmbito  da  prestação  específica  do  comerciante,  cuidando- se  de  caso  fortuito  externo, ensejando-se, por  conseguinte, a  exclusão de sua responsabilidade pelo lamentável incidente.

III – O dever de segurança, a que se refere o § 1º, do artigo 14, do  CDC,  diz respeito  à  qualidade  do  combustível,  na  segurança  das  instalações, bem  como  no  correto  abastecimento,  atividades,  portanto, próprias de um posto de combustíveis.

IV   –   A   prevenção   de   delitos   é,   em   última   análise,   da   autoridade pública    competente.   É,    pois,    dever    do    Estado,    a    proteção    da sociedade,  nos  termos  do  que  preconiza  o  artigo  144,  da  Constituição da República.

V – Recurso especial improvido.

Dessa  forma,  por  se  tratar  de  roubo  ocorrido  em  posto  de combustíveis, a situação se tipifica como de força maior ou caso fortuito externo, motivo pelo qual é aplicável a excludente de responsabilidade do posto de combustíveis, porquanto seria IMPOSSÍVEL que o revendedor evitasse o roubo. Mesmo que houvesse um maior investimento em segurança, ainda assim na maioria das vezes é inevitável a ocorrência do crime.

 É um dever do Estado promover a segurança pública, não sendo razoável que o judiciário diante da ineficiência do poder público em garantir a segurança da sociedade venha a transferir para o empresário o dever de prevenir roubos, o que em última análise é impossível.

 Enfim, cada caso será julgado de acordo com provas produzidas e conforme o entendimento do julgador, sendo que circunstâncias como o efetivo investimento em segurança por meio de câmeras e presença de seguranças uniformizados podem demonstrar que o posto tomou as medidas preventivas possíveis. Por outro lado, a circunstância da cobrança de estacionamento pode pesar contra o posto. De toda a forma, o precedente jurisprudencial citado acima serve de alento ao revendedor, pois o Superior Tribunal de Justiça – STJ já julgou que o posto de combustíveis não deve responder pelos prejuízos causados a cliente que foi assaltado em seu estabelecimento.

 A conclusão é que em caso de roubo na área de postos de combustíveis não há que se falar em responsabilidade civil do revendedor, ante a ausência de obrigação legal de garantir a segurança, impossibilidade de impedir a ocorrência daquele tipo de delito, bem como pelo singelo fato de que a segurança pública é dever da Autoridade Pública, sendo injusto e sem base legal transferir os ônus de sua ineficiência para o ente privado.

 Porto Alegre, 17 de fevereiro de 2014.

FELIPE KLEIN GOIDANICH OAB/RS 55.000

(CONSULTOR JURÍDICO DA FECOMBUSTÍVEIS)

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