A criatividade do Legislativo na elaboração de normas não tem limites, exigindo das empresas um trabalho extra para acompanhar a proliferação de leis publicadas diariamente e as alterações feitas ao longo do tempo sem aviso prévio. No caso do comércio, são muitas as exigências legais, traduzidas em avisos obrigatórios que devem estar visíveis aos olhos dos clientes e consumidores.
Somadas, as normas estaduais, municipais e federais comporiam uma vitrine de quadros de avisos. Uma das mais novas exigências do gênero saiu do gabinete do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, transformada na Lei 15.458, publicada no Diário Oficial no dia 19 de junho. A norma obriga os “estabelecimentos” a divulgarem por meio de cartazes os dizeres: “Violência, Abuso e Exploração Sexual Contra a Mulher é Crime. Denuncie – Disque 180”. As placas com a informação devem ser afixadas em locais de fácil acesso, no seguinte tamanho: 297 mm de largura por 420 mm de altura. Nem mais, nem menos.
A origem da legislação é o projeto de lei nº 386, de autoria do deputado Rodrigo Moraes (PSC). O parlamentar esperou um ano para que a sua sugestão saísse do papel. A proposta foi levada à Assembleia Legislativa em junho de 2013 e continha um inciso que estabelecia multa a quem a descumprisse, com base em VRTE (Valor de Referência do Tesouro Estadual).
O governador paulista vetou o inciso que tratava da aplicação da multa. O estabelecimento que deixar de obedecer será apenas advertido por escrito, por autoridades que serão conhecidas somente depois da regulamentação. Por ora, sobra a preocupação com o espaço físico para cumprir tal exigência.
Levantamento do Sindilojas-SP traz algumas das imposições que viraram leis para os estabelecimentos comerciais e de serviços. “Proibida a entrada com capacete (Lei Estadual nº 14.955) e Exija a Nota Fiscal (Lei Estadual nº 9.990) são algumas das informações que devem estar visíveis. O disque denúncia é só mais uma. “Dependendo do tamanho do estabelecimento, a decoração de uma loja será de placas”, prevê Elisângela Matsune, assessora jurídica do Sindicato, que representa as lojas do comércio de rua e de shoppings na capital paulista. De acordo com a advogada, a norma precisa ser regulamentada e há dúvidas sobre a sua abrangência. O texto, por exemplo, cita como estabelecimentos sujeitos à obrigação pensões, motéis, pousadas, bares, restaurantes, lanchonetes, casas noturnas, clubes sociais, salões de beleza, casas de sauna e edifícios comerciais e de serviços públicos. “Shoppings ou centros comerciais são considerados edifícios comerciais?”, indaga a advogada. Da mesma forma, a resposta para essa questão virá depois da regulamentação.
ESDRÚXULAS
O economista Marcel Solimeo, da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), critica não só a legislação que acaba de sair do forno, mas as antecessoras do mesmo naipe. “Há um número expressivo de normas esdrúxulas, incompatíveis com a atividade econômica e ineficazes, pois não agregam benefícios para a população”, afirma. Para o economista, o setor privado não é repartição pública.
Uma empresa deve se preocupar com o bom atendimento de seus clientes. “Essas intervenções desnecessárias geram custos, apesar de aparentemente simples para sem cumpridas”, afirma, ao lembrar de outra norma estadual que obriga os estabelecimentos a informarem o ranking do Procon dos dez fornecedores mais reclamados. Ele se refere à Lei nº 15.248, publicada em dezembro do ano passado, que também depende de regulamentação. “Esse ranking traz números absolutos, sem uma ponderação que reflita a realidade”, ressalta.
No rol de exigências feitas aos estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços está a de deixar em local de fácil acesso o Código de Defesa do Consumidor, expressa na Lei Federal nº 12.291, publicada em 2010. A multa para quem descumprir é de R$ 1.064,10. Além disso, a Lei Estadual nº 2.831 obriga desde 1982 a informar o endereço e os números do Procon. Em breve, será incorporada à vitrine dos estabelecimentos o 180 do Disque Denúncia. Agora, só resta ao comércio torcer para a efetiva redução da violência contra a mulher.