De um lado, o elevado preço do combustível e até proibições de prefeituras. De outro, aumento da frota de carro elétrico e incentivos fiscais.
O futuro dos postos de combustíveis parece sombrio. Virar ou não peça de museu depende de como os revendedores de combustíveis estejam dispostos a ouvir os seus consumidores.
Nos últimos anos, muita gente passou a enxergar algum valor decorativo (discutível, por sinal) em bombas de combustíveis, letreiros de postos, macacões de frentistas e outros objetos presentes em postos de combustíveis. Tanto é verdade que antiquários e até comércios eletrônicos estão cheios desses produtos.
Outros, no entanto, entendem que esses objetos deveriam estar preservados em museus, principalmente porque serão lembrados no futuro como um marco de uma era gloriosa dos carros movidos à gasolina. Nos EUA já existem até museus, caso do Reiffs Gas Station Museum, em Woodland.
Em São Paulo não existe um museu, porém temos um posto de combustível tombado pelo patrimônio histórico da cidade desde 2015. Inaugurado nos anos 1930, ele está localizado no número 11 da Avenida Aclimação.
Ao que tudo indica, virar museu ou se tornar peça de decoração vintage podem ser os prováveis destinos dos postos de combustíveis em pouco tempo. E não são poucos os indícios que apontam para um destino quase inevitável desses espaços.
Mudança de comportamento
Um dos principais motivos está relacionado a mudança de hábito do consumidor.
Há muitos anos a Consumidor Moderno alerta que as novas gerações de consumidores não desejam mais ter um carro na garagem.
Na verdade, quando elas olham para um veículo, elas enxergam apenas mais um serviço dentro de um aplicativo.
Não à toa, o setor de mobilidade por aplicativo cresceu de maneira espantosa ao redor do mundo. Hoje existem Uber e 99, além de outros que atuam em países como nos EUA, caso do Lyft, Juno, Gett, Wingz e tantos outros.
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Mesmo entre aqueles que querem dirigir, a palavra de ordem também é serviço. Diversas montadoras e até seguradoras oferecem carros por assinatura cheio de serviços agregados, inclusive com o próprio seguro do carro.
O resultado dessa mudança no comportamento do consumidor é curioso. Montadoras registram quedas sucessivas nas vendas de veículos. De acordo com a Anfavea, entidade patronal das montadoras, o primeiro trimestre deste ano foi o pior em vendas dos últimos 16 anos.
Por outro lado, a Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis (ABLA) afirma que o setor alcançou em 2021 uma frota total de 1,136 milhão, crescimento de 12,8% na comparação com a frota registrada no final de 2020. Hoje, eles representam de 20% a 22% de todos os emplacamentos do País.
Ou seja, a mobilidade é um dos principais clientes das montadoras.
Matriz energética limpa?
A busca por uma nova matriz energética do veículo também é outro fator cada vez mais decisivo entre os consumidores que ainda querem dirigir um carro.
Neste momento, empresas caminham na direção de carros movidos à eletricidade, principalmente pela promessa de uso de uma energia mais limpa (o que é uma meia verdade) e barata para o bolso do consumidor se comparado a gasolina ou etanol. E esse argumento parece cada vez mais presente no imaginário do consumidor.
Um recente levantamento feito pela Finclass, uma plataforma masterclass de finanças, comparou o custo de dois carros: o Kwid E-Tech e o Volkswagen T-Cross. Embora sejam carros de categorias diferentes, o levantamento levou em conta a semelhança no preço dos veículos.
Para encher o tanque de um Volkswagen T-Cross, o custo médio após um ano de uso é de R$ 7.296,52 ou R$ 608,04 mensais. Para chegar nesse resultado, o estudo considerou o preço médio da gasolina (em São Paulo) nos últimos 15 dias, de R$ 7,12 o litro, e a média de 12.400 km rodados no período – quase 35 km/dia.
Com a mesma base de km rodados e o custo médio de R$ 0,66 o kWh, o resultado de gastos com o Kwid E-Tech chega a R$ 744 – R$ 62/mês.
O preço, como se pode notar, ainda é um problema para a massificação do carro elétrico, porém existe a promessa de que eles ficarão mais baratos em pouco tempo. Primeiro porque o custo de uma bateria, hoje, representa 10% do que custava há 10 anos. E a tecnologia continua evoluindo de uma maneira realmente espantosa.
Além disso, muitos governos tem concedido incentivos fiscais para a massificação do carro elétrico.
Na China, por exemplo, o governo “paga” 30% de carro elétrico por meio de incentivos fiscais. E esse percentual já foi maior: em 2016, ele era de 50%.
Existem ainda incentivos em países da Europa e até estados norte-americanos. No Brasil, já existem projetos de lei que tentam estimular o carro elétrico, sendo que alguns deles sugerem até mesmo zerar o imposto de importação desses veículos.
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Vendas em alta
Tudo isso tem favorecido para o aumento da frota de carros elétricos no mundo. E os resultados são bem expressivos.
Em 2021, no mundo todo, foram emplacados aproximadamente 4,2 milhões de carros elétricos, o que representa 6,2% das vendas globais de carros. Além disso, segundo dados da International Energy Agency, carros elétricos representam 9% do mercado global de carros.
No Brasil, a frota é pequena, quase imperceptível. Hoje, menos de 1% dos carros elétricos emplacados no mundo estão aqui, porém esse cenário pode ser temporário. Estão previstos 17 modelos de carros elétricos somente para este ano, além de 11 novos modelos de veículos híbridos, que rodam com eletricidade e combustíveis fóssil.
Além disso, montadoras como Renault, Nissan, GM já falam abertamente sobre o fim de carros movidos a combustão e isso nos remete a pergunta inicial: como tudo isso vai impactar no futuro dos postos de combustíveis?
Fim da linha?
Em um cenário de grandes mudanças de comportamento e estímulos a carros elétricos, é natural pensar no fim dos postos de combustíveis – pelo menos no formato atual.
Aliás, quando o assunto é posto de combustível, está ocorrendo justamente o inverso do carro elétrico: existem cidades desestimulando e até proibindo o surgimento de novos postos.
Em 2021, Petaluma, na Califórnia, tornou-se a primeira cidade do mundo a proibir novos postos de gasolina. Desde então, pelo menos mais quatro cidades proibiram permanentemente novos postos de gasolina e pelo menos mais seis (incluindo Los Angeles) estão desenvolvendo políticas agora.
Entre os argumentos dessas prefeituras, nota-se um forte apelo ambiental.
No entanto, o que realmente parece estar em jogo é o fator econômico e até arrecadatório.
De acordo com a consultoria Boston Consulting Group (BCG), 80% dos novos postos que surgirem até 2035 não serão rentáveis. Ou seja, esse cenário não é nada bom para muitas prefeituras.
Ainda segundo a consultoria, postos podem sobreviver diante de um cenário de uma mobilidade mais elétrica, mas, para isso, elas precisam ouvir o consumidor.
É preciso antever novas demandas dos consumidores e necessidades de quem usa carro. Hoje, já existem postos que oferecem serviços ou vantagens para quem trabalha com aplicativo de mobilidade.
Ou seja, virar ou não peça de museu depende de como as empresas andam ouvindo os seus consumidores.
Fonte: Consumidor Moderno