O percentual de biodiesel no óleo diesel voltou a ser tema de discussão entre entidades ligadas ao setor.
A Confederação Nacional do Transporte (CNT), divulgou nesta sexta, 30, um comunicado que é apoiado por outras nove entidades de setores automotivos e de combustíveis em que “manifesta preocupação com a elevação do teor compulsório para 12% de biodiesel (B12) na mistura de óleo diesel comercializado à sociedade”.
⛽ Segundo o comunicado, a mistura obrigatória de biodiesel ao óleo diesel para até 15%, autorizada pela Lei nº 13.263/2016, está condicionada à realização de testes que validem a utilização desses percentuais. No entanto, segundo a CNT, “os testes realizados não confirmaram a viabilidade da utilização de teores até B15. A maioria dos relatórios apresentados pelas montadoras evidenciou preocupações quanto ao aumento do teor de biodiesel no diesel”.
O documento da CNT ainda aponta que as decisões de elevação do teor compulsório de biodiesel têm ocorrido sem levar em conta os citados problemas.
“Além disso, outras importantes utilizações do biodiesel não foram testadas, como o uso em usinas termelétricas e em motores Proconve P8/L7, previstos para o Brasil a partir de 2022. Para que essa nova tecnologia reduza as emissões, é necessário que os combustíveis tenham especificações mais rigorosas que as atuais”, diz o comunicado.
❌ A CNT segue com ponderações contrárias à mistura de biodiesel no diesel, afirmando no documento que teores elevados do biocombustível provocam uma série de danos nos motores e volta a reforçar a necessidade de testes que validem a utilização de percentuais mais elevados. Diante dos argumentos apresentados, a CNT sugere um percentual menor na mistura.
“Recomendamos a manutenção do teor de biocombustíveis no diesel em 10% até que se alterem as suas especificações e sejam realizados testes para comprovar a viabilidade técnica e a segurança para a utilização de teores mais elevados. Por fim, defendemos a introdução ampla de novos biocombustíveis, a fim de fomentar a competição entre produtos e promover melhorias quanto à oferta, preço e qualidade”.
Aprobio questiona informações sobre o biodiesel e fala em ‘fake news‘
Após a divulgação do comunicado da CNT, a Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), disse, em nota, que as informações que indicam danos aos motores de veículos com maior percentual de biodesel, foram apresentadas sem fontes de dados concretos e sem sustentação em estudos referenciais indicados.
“É falso afirmar que “os testes realizados não confirmaram a viabilidade da utilização de teores até B15. Desde a criação do Programa, foram realizados amplos estudos, testes e ensaios pelos Ministérios de Ciência e Tecnologia e de Minas e Energia, garantindo que o biodiesel chegasse ao mercado com alto padrão de qualidade. A Aprobio esclarece que nenhum dano a máquinas e motores foi comprovado pela ação direta ou indireta da utilização do biodiesel nas misturas já aprovadas pelos fabricantes de motores e equipamentos e pelo Ministério de Minas e Energia (MME)”, diz a nota.
Para reforçar a sua tese, a Aprobio divulgou documentos que, segundo a entidade, comprovam a eficácia do B 15 e do B 10 em motores e veículos. Os links para os documentos dos testes para o B 15 podem ser acessados neste link. Os arquivos de teste com o B 10 estão disponíveis aqui. “Os dois documentos contaram com a participação de várias entidades e empresas do setor automotivo e de distribuição de combustíveis”, ressalta a nota da Aprobio.
A entidade que representa os combustíveis também afirma ser falsa a afirmação feita pela CNT e demais entidades de que as decisões de elevação do teor compulsório têm ocorrido sem levar em conta quaisquer problemas.
“A partir desses estudos, o setor de biodiesel fez os investimentos necessários que permitiram aprimorar as especificações do biodiesel e atender à solicitação dos representantes do setor automotivo, o que garantiu o caminho à ampliação prevista da mistura até B15. Desde a primeira resolução, de 2004, foram realizadas quatro atualizações, alinhando a especificação nacional do biodiesel aos requisitos internacionais. A especificação do biodiesel brasileiro já tem parâmetros muito mais severos do que os que são praticados na Europa, o que faz do produto brasileiro um produto superior”.
A Aprobio finaliza a nota dizendo estar à disposição para esclarecer qualquer dúvida que envolve o setor. “Os produtores de biodiesel se mantêm abertos ao diálogo em todo o período de avanços dos biocombustíveis no Brasil. Participamos de todos os estudos sérios. Nesse contexto, surpreende a postura pública desta manifestação divergente dos compromissos por todos os envolvidos”.
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Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP)
O Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), que representa petroleiras no Brasil, juntamente com outras entidades pediram ao governo que mantenha a mistura obrigatória de biodiesel no diesel vendido nos postos em 10%, alegando que percentuais maiores não se mostraram eficientes, o que foi contestado por produtores.
A previsão atual é que a mistura obrigatória a ser considerada no 81º leilão de biodiesel, em 6 de agosto, seja elevada a 12%, após uma redução temporária nos dois certames anteriores, quando os altos preços da soja deram impulso à cotação do produto derivado da oleaginosa.
Embora represente uma elevação frente aos leilões 79 e 80, a mistura fixada para as contratações que atenderão ao bimestre setembro-outubro ainda fica abaixo da marca inicialmente estipulada para este ano, de 13% –percentual que produtores de biodiesel defendem que seja retomado ainda este ano.
Além do IBP, assinaram o comunicado a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), a Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis), a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores(Anfavea), a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), a Confederação Nacional do Transporte (CNT), dentre outros.
ANP concluiu estudos técnicos internos
O debate sobre a especificação está em curso na Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que já fechou um esboço da minuta de resolução que será apresentada ao mercado.
A nova resolução deve ser publicada até 31 de dezembro deste ano, segundo previsão da agenda regulatória vigente.
A agência concluiu os estudos técnicos internos e realiza reuniões com os diferentes setores do mercado para colher contribuições e preparar a consulta e audiência públicas.
As conversas incluem empresas de engenharia, para colher opiniões sobre o impacto em custos para elevação da mistura. E as montadoras, representadas pela Anfavea, além do mercado de combustíveis.
“A ANP vai dar o primeiro passo com a especificação. Os trabalhos estão a pleno vapor”, afirmou Carlos Orlando da Silva, superintendente de Biocombustíveis e Qualidade de Produtos da agência.
O resultado de estudos feitos pelo mercado foi publicado em 2019 (.pdf), mas chegou-se a conclusão na época que novas análises eram necessárias.
Essas questões foram debatidas por três anos, em conjunto com o Ministério de Minas e Energia (MME) e a ANP.
Em 2019, a agência antecipou exigências relacionadas à oxidação do biodiesel, com adição de aditivos. E no mercado, produtores antecipam a redução de metais pesados no biocombustível, que será cobrada no Proconve.
“Empresas, mesmo com resultados favoráveis e satisfatórios para a mistura B15 (em alguns casos, favoráveis à mistura B20), fizeram ressalvas específicas quanto à importância da manutenção da qualidade do combustível durante sua vida útil”, registrou o MME.
A disputa é por mercado
O debate vai além da especificação em si e dependerá da decisão política do governo federal, por meio do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).
A campanha, de ambos os lados, se estende ao Congresso Nacional, onde tramitam projetos para fixar em lei tanto a mistura de biodiesel como HVO e bioQAV.
E gira em torno de qual será a inserção dos combustíveis que podem substituir tanto o diesel de origem fóssil — mais poluente — quanto o biodiesel, além da própria progressão da mistura do biocombustível no diesel B, vendido nas bombas.
Além do biocombustível em si, há custos na cadeia relacionados à manipulação e transporte para impedir a deterioração do biodiesel, por exemplo.
Lado a lado
A discussão econômica, que envolve o preço e a fatia que será disputada por cada segmento, terá efeito no mercado futuro de aviação.
O Brasil é signatário do Corsia, Esquema de Compensação e Redução de Carbono para a Aviação Internacional, cuja fase obrigatória começa em 2027 — e o bioQAV é uma aposta do setor para reduzir suas emissões.
Empresas aéreas que não atingirem as metas, precisarão compensar emissões, incorrendo em custos da mesma forma.
Os produtores, portanto, afirmam que a ausência de uma política clara para os novos combustíveis prejudica a aprovação de investimentos locais para suprir essa demanda cativa localmente, levando a mais importação.
O grupo de distribuidoras e revendedores que assina a nota desta sexta (30) defende a concorrência aberta entre o biodiesel e o diesel verde (HVO), por exemplo, que também é produzido em usinas e biorrefinarias a partir de biomassa, pelo processo de hidrotratamento.
Essa posição tem apoio da Petrobras, que tem no seu plano de negócio a entrada no mercado de biorrefino, seja pela oferta de combustível de origem renovável por coprocessamento ou no futuro pelo investimento em unidades de biorrefino para disputar o mercado de HVO e bioQAV (SAF) — programa BioRefino 2030.
Um argumento é o preço: com a possibilidade de concorrência pela oferta da parcela renovável no diesel, seria possível amenizar impactos no consumidor — o diesel é o combustível mais utilizado no país e impacta diretamente o custo do frete.
Outro é a consequente velocidade da descarbonização. Se o custo for inadequado à realidade brasileira, vai atrapalhar o deslocamento de diesel na frota.
Se a posição da Petrobras for atendida, ela e outros eventuais refinadores ganham a possibilidade de ofertar diesel pronto para o consumo final direto das refinarias, com parcelas renováveis na composição.
Os produtores de biodiesel, por sua vez, defendem a inserção complementar do HVO, preservando a mistura obrigatória do biodiesel e destinação de uma parcela adicional de diesel verde — por exemplo um B15H5, com 15% de biodiesel, 5% de HVO e 80% de diesel fóssil.
Cada ponto percentual representa milhões de litros comercializados nos leilões regulados pela ANP. No L79, o primeiro deste ano em que houve a redução do B13 para o B10, em função do preço do óleo de soja, foram negociados 1,05 bilhão de litros; com 13%, seriam 315 milhões a mais.
Além dos impactos na saúde. “Estima-se que este programa [do biodiesel] evitou 244 mortes ao ano, e que a população deixou de perder 9 dias de vida,
desde o nascimento. Caso o percentual de biodiesel no diesel B atingisse 15%, haveria 104 mortes por ano a menos e a expectativa de vida aumentaria em mais 4 dias, quando comparadas à trajetória B10”, diz análise da Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
No início de julho, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) fixou em 12% o percentual do biocombustível comercializado no 81º leilão (L81) para abastecer o mercado entre setembro e outubro.
Produtores pedem consulta pública para rever especificações
Associações do setor de biodiesel (Abiove, Aprobio e Ubrabio) solicitaram à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) a abertura de uma consulta pública para revisão das especificações técnicas do biocombustível.
O objetivo é adequar a especificação do biodiesel puro e em mistura com o diesel às novas regulamentações, entre elas a fase P8 do Programa de Controle de Emissões Veiculares (Proconve).
Previsto para iniciar em 1° de janeiro de 2022, o Proconve P8 traz metas mais restritivas para a emissão de poluentes vindos da combustão do diesel, com exigência da adoção de tecnologias e motores menos poluentes.
É equivalente às normas já adotadas nos Estados Unidos e na Europa com o Euro 6.
A carta assinada pelas três associações pedindo a consulta pública foi encaminhada à diretora da ANP Symone Araújo, e aos superintendentes Carlos Orlando da Silva e Danielle Conde.
O documento também foi enviado ao secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia, José Mauro, e ao diretor do Departamento de Biocombustíveis do MME, Pietro Mendes.