Releitura atual feita por uma Contabilista.

Aposentadoria especial para os frentistas é hoje um assunto em pauta devido há uma série de novas interpretações e direitos que os frentistas vêm adquirindo com o passar dos tempos. Tentarei expor neste texto e de forma simplificada, parte do contexto legal que lastreia o tema da aposentadoria especial dos frentistas. Mostrando de forma também temporal, a caminhada da legislação brasileira específica ao tema em estudo.

VISÃO LEGAL E JURISPRUDENCIAL SOBRE O TEMA

Para iniciar, em 2013 tivemos a publicação do Decreto 8123 em 17/10/2013, no qual a legislação sobre a aposentadoria especial de frentistas por exposição ao benzeno ganhou força por efeito da alteração dos artigos 64 e seguintes do Decreto 3048/99, que inovou no que se refere à caracterização da permanência não ocasional e nem permanente ao produto por parte dos frentistas.

Não podemos esquecer que o Decreto 4.882/03 já havia reforçado a questão também, junto ao Decreto 3048/99, ampliando a interpretação de exposição (não ocasional ou intermitente) às atividades de risco, conforme se lê em seu artigo 1º. Por outro lado, na legislação trabalhista da época, já existia a autorização da atividade de risco pelo critério quantitativo do agente químico benzeno. E se analisarmos a NR 15, anexo 13, temos que o produto benzeno está relacionado no rol dos agentes tido como produto cancerígeno (legislação trabalhista).

Para ampliar as bases deste estudo temos que, ao se consultar amostras de PPP’s – (Perfis Profissionais Psicográficos) – realizados nos anos de 2013 e seguintes, percebemos que a grande maioria não evidenciava indícios de exposição ao benzeno capaz de sinalizar seu uso para aposentadoria especial. Sendo em sua maioria omissos sobre o correto preenchimento dos PPP’s, o que causou uma falta de orientação correta aos trabalhadores e os proprietários de postos de combustíveis sobre a melhor confecção e importância deste documento. Com isto, existindo conflito entre os PPP’s e a legislação previdenciária, varias ações com pedido de concessão de aposentadoria especial eram negadas pela via administrativa junto ao INSS. Fato que levou estes pedidos aos Tribunais Superiores e por consequência criou uma nova série de jurisprudências e súmulas cujo objeto se fixou na concessão de várias aposentadorias especiais.

Continuando nossa análise, em 28/11/2013, o TRF/4 (Porto Alegre – RGS), por voto do Desembargador Federal Celso Kipper – Apelação nº 5012231-25.2010.404.7000, Sexta Turma – sobre tempo de serviço especial relativo ao benzeno – manifestou seu entendimento da seguinte forma: “O VRT vem estruturar um conjunto de normas e prevenção segurança do trabalho, fixando valores em VRT e PPM realizados junto ao Benzendo, mas isto não descaracteriza o direito de aposentadoria especial em casos de exposição inferior a estes valores”.

Em consonância com a interpretação jurisprudencial da época, o Decreto 3048/99, já com as alterações que se seguiram, veio preservar o critério quantitativo em seu artigo 68, § 2º. Estabelecendo que as atividades que aceitavam o critério quantitativo e estavam listadas no anexo IV deste mesmo decreto de nº 3048/99, e, que só permitiam a aposentadoria especial se os índices de benzeno fossem em “quantidade” superior a previsão da época. Fato esse que com o passar dos tempos criou uma controvérsia entre os PPP’s geralmente emitidos pelas empresas de Saúde Ocupacional, haja vista, uma clara precariedade no que se refere às informações histórico/funcionais dos empregados no que se refere à exposição aos riscos ocupacionais por benzeno.

Este decreto, inclusive, descreve a obrigação de se entregar em até 30 dias após a rescisão contratual dos funcionários, o PPP relatando os riscos e meios eficazes que as empresas adotaram para zelar pela saúde dos seus funcionários, conforme as normas contidas nas NRs que normatizam a questão do benzeno. Dando a estes funcionários o direito de solicitar junto ao PPP copia do PCMSO e LTCAT, garantido o direito de retificação de informações quando em desacordo com a realidade do trabalho prestado em postos de combustíveis (art. 68, §10 do mesmo decreto).

Ato contínuo, vamos agora analisar as NRs que mais interessam ao caso concreto, ou seja, a NR 15 e a 16 expedidas pelo Ministério do Trabalho brasileiro. Primeiro vamos falar sobre a NR 15, a qual trata sobre atividades Insalubres, ou seja, sobre as atividades que são desenvolvidas acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e intensidade do agente e do tempo em exposição. De forma complementar temos a NR 16, que trata das atividades perigosas nas quais a natureza ou método de trabalho impliquem no contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado. Ficando certo que, mesmo havendo exposição do empregado a dois agentes diversos – um perigoso e outro que cause lesão à saúde – fica assegurado ao empregado o recebimento dos dois adicionais (de forma não cumulativa) podendo optar pelo que melhor lhe favoreça. Ressalto ainda, que estas NR’s são exclusivas do Ministério do Trabalho, com o sentido de proteção a saúde do trabalhador, zelando pelo bem estar da equipe de trabalho exposta a perigo ou risco e tentando minimizar qualquer implicação que cause danos à saúde do trabalhador. (IRR-239-55.2011.5.02.0319 – julgado em 27/09/19 – A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho – TST).

Em complemento, analisando outras decisões judiciais, se percebe ainda uma intenção clara do legislador e do próprio judiciário em preservar o: artigo 7º, Inciso XXVI, da Constituição Federal, no sentido de que se há previsão convencional, aplica-se a norma mais benéfica a cada caso.

EXPOSIÇÃO PERMANENTE E APOSENTADORIA ESPECIAL

 Feitas as considerações acima, vamos agora analisar as questões afeitas à exposição permanente e a aposentadoria especial. Por inicio, fica o questionamento, o que seria então exposição permanente? significa que a simples exposição aos agentes nocivos não podem ser considerados pelos critérios da eventualidade, qualitativos ou intermitentes. Se analisarmos alguns laudos de empresas de saúde do trabalhador consoante às regras PCMSO, PPRA ou LTCAT’s, mesmo que não contemporâneos ao período trabalhado, notamos a princípio, que a maioria dos laudos são aptos à comprovação da atividade especial do segurado. Nestes laudos, conforme análise, não há relatos em sua maioria de indicação de exposição a agentes químicos capazes de conceder de imediato a aposentadoria especial. Mas existe também em sua maioria critérios de análises quantitativas e qualitativas, bem como indicação de propostas e EPI contemplados pelas NR, que estão sendo usados pelo judiciário como base para a concessão de aposentadoria especial com base na permanência e contato não ocasional com o benzeno.

Para aumentar a dissonância sobre o tema, temos o entendimento do STF, ARE 664.335 em que sendo o EPI eficaz para neutralizar o tempo de atividade insalubre ou perigosa, não se caracteriza como especial o pedido de aposentadoria. A ressalva sobre o tema se dá no fato de que o direito a aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador ao agente nocivo, excluindo do rol de exceções alguns agentes considerados nocivos como o RUIDO, o qual mesmo com a eficácia do EPI, não descaracteriza a atividade especial para fins de aposentadoria, bem como, os agentes químicos/cancerígenos destacados na tabela da LINACH; onde se encontra incluído o benzeno.

De forma complementar, destaco que o LTCAT deve informar sobre a existência de tecnologia coletiva que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção (art. 2º. Lei 8.213/91). Sendo estes laudos devidamente assinados por profissionais qualificados, demonstrando que os níveis nos quais se encontram os riscos são aceitáveis. Esse talvez seja um divisor de águas no futuro.

Colocadas estas informações em destaque, temos que em toda esta dissonante aferição dos fatos, hoje o Brasil tem aproximadamente 40.000 postos de combustíveis ativos. Não obstante, temos também aproximadamente 500.000 trabalhadores expostos ao agente químico benzeno, os quais segundo as regras hoje existentes estão sentenciados a morte pela pura exposição ao benzeno nas atividades diárias de revenda de combustíveis em nosso país.

Diante desta celeuma, fica aqui uma chamada para um marco reflexivo, através das seguintes perguntas cujas respostas ainda não se apresentaram. Como o Governo Brasileiro irá se posicionar sobre o tema, frente a uma enxurrada de aposentadorias especiais a serem concedidas em plena reforma da previdência que visa economia nas contas públicas? Conforme modelo de outros países, será permitida a atividade de auto abastecimento (queda da lei 9956/00), com a finalidade de preservação da vida de vários profissionais do setor? Os cofres públicos vão suportar a concessão de aposentadorias especiais a toda cadeia do seguimento de combustíveis aos 25 anos de trabalho na atividade por contato com o benzeno? De que valem os exames clínicos exigidos aos frentistas de seis em seis meses se o simples contato com o ambiente, segundo entendimento jurídico, já provoca a contaminação pelo benzeno? Quantas são as atividades relacionadas como de exposição a agentes químicos, constantes na LINARCH, que ainda precisam ser PROTEGIDAS e acolhidas da mesma forma como o benzeno na concessão de aposentadorias especiais?

Como ainda não temos estas respostas, vamos à realidade das empresas revendedoras de combustíveis. Uma delas está bem visível na imensidão de portarias e normas reguladoras que disciplinam o setor. Podemos destacar que atualmente várias portarias e decretos são publicados para que cada vez mais o odor dos combustíveis não vire vapor dispersado no ambiente de revenda, vindo a prejudicar a saúde de todos os envolvidos na atividade. Com a nova interpretação jurídica, será que todos estes custos são necessários? Para que exigir mais segurança se a interpretação da lei feita hoje não permite a minoração de efeitos por praticas de EPI’s individuais ou coletivas..

E em se falando de revenda de combustíveis, podemos destacar as características subjetivas do setor, o qual é castigado pelo alto custo das exigências fiscais, legais e tributarias. E agora com mais uma surpresa na pressão do governo via receita federal, que meramente envia uma intimação para um grupo seleto de sorteados, para “ver se cola” um tema delicado e cheio de contradições, aumentando ainda mais a dura realidade dos revendedores de combustíveis. Presente de Natal ou caixinha de ano Novo de forma imprópria? Ainda não temos estas respostas também.

Diante de todo esse cenário o que fazer para diminuir os efeitos desta nova releitura tributária? A decisão é dentro da realidade de cada empresário do ramo frente a sua realidade comercial, fiscal, tributária, contábil e administrativa. Nesta hora todo empresário do setor deve analisar se todos os laudos apresentados são capazes realmente de atestar o risco na revenda combustível com traços de benzeno, buscando conhecimento sobre o assunto para que o mero sentimento de ter que cumprir com um ato aparente de “bitributação” não se torne a mola mestra de encerramento de suas atividades no futuro.

Independente da decisão a ser tomada, deve-se mostrar ao governo a indignação da classe afetada com mais este custo agregado e com a falta de respeito com os revendedores de combustíveis pátrios. Sendo certo que calar não será a melhor resposta diante desta provocação, sendo necessários implementos jurídicos eficazes, para que o pagamento desta nova carga tributária, se dê apenas e após o esgotamento judicial desta demanda frente a realidade do país e da realidade do já sofrido mercado de revenda de combustíveis brasileiro.

Junto a isso todo revendedor de combustíveis tem que ter como prioridade a necessidade de Identificação e entendimento das NR’s específicas ao tema. Procurando conhecer cada processo e obrigação, entendendo também a diferenças entre as legislações Trabalhista e Previdenciária em todas as suas diferenças sobre o caso em debate. Questionando sempre as empresas de Saúde do Trabalhador sobre a realidade de cada posto e suas características ambientais próprias, pedindo orientações corretas e transparentes às estas empresas. Não mais que isso, todos os revendedores devem ainda zelar pela vida de seus colaboradores, envolvendo os equipamentos de EPI’s necessários, estudando dentro de sua empresa cada cargo envolvido diretamente com o processo de revenda e dialogando com a sua contabilidade na busca de saídas apropriadas a cada caso.

Por fim, esperamos que a legislação aqui estudada seja, no mínimo, revista para se evitar em um primeiro momento um cem número de demissões pelo Brasil a fora, devido ao forte impacto na carga tributária dos revendedores de combustíveis. Com repercussão, inclusive, nas contas públicas pelo alto número de aposentadorias especiais concedidas, sendo clara a necessidade de verificação de ocorrência de “bitributação” sobre o mesmo fato gerador como meio de cautela tributária especifica ao setor de revenda de combustíveis.

Fica por fim a nossa esperança que as legislações sejam revisadas corretamente e que se realmente os atos de revenda de combustíveis colocam a vida dos frentistas em risco, que se faça uma revisão na lei 9956/00, para permitir o auto abastecimento no Brasil devido ao risco a vida, ou que permita a criação de escalas de trabalho que evitem a permanência ou exposição permanente dos frentistas à eventual risco de manipulação de produto perigoso! Que dias melhores venham em favor de todos!

Texto elaborado por Mara Lucia Costa – CEO do Grupo Empresarial Revenda Contábil em Belo Horizonte – MG.

Assista a Palestra com Orientações sobre Aposentadoria Especial para os Frentistas ministrada por especialista da área.

 

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