Número de registros de infrações por falta de cumprimento da lei do descanso saltou de 5.775 em 2018 para 21.499 em 2020. Neste ano, a média mensal é de 2.200
O número de infrações por desrespeito à Lei do Descanso aumentou 272% nos três últimos anos. Os dados são da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
? A lei 13.103, de 2015, conhecida como Lei do Descanso determina paradas de 30 minutos a cada cinco horas e meia ininterruptas ao volante. Além disso, o motorista profissional deve parar por uma hora durante essa jornada para se alimentar.
? Outra regra é que o condutor faça um intervalo diário de 11 horas entre uma viagem e outra.
Contudo, o desrespeito da lei está crescendo no País. Em 2018, houve 5.775 registros de infrações. Já em 2019 foram 20.444. Ou seja, uma alta de 254%.
Em 2021, média foi de 2,2 mil registros por mês
Porém, os números não pararam de subir. Assim, em 2020 foram 21.499 infrações. Portanto, a alta em comparação com 2018 foi de 272,3%.
Em 2021, os números continuam subindo. Até maio, a PRF registrou 11.366 infrações. Assim, a média foi de 2.273 registros. Ou seja, se o ritmo for mantido, a soma dos 12 meses do ano pode passar de 27.200 registros.
Segundo a PRF informou ao Estradão, houve várias mudanças na fiscalização ao longo do tempo. Inclusive houve um período em que ficou suspensa. Assim, o ano de 2018 foi de adaptação à legislação.
⛔ Multa de R$ 130,16 e 4 pontos na CNH
Nesse sentido, a PRF informa que foi feito um trabalho de orientação aos motoristas. Ou seja, só depois teve início a fiscalização. Assim, essas mudanças ajudam a justificar a alta nos números.
Seja como for, os dados são preocupantes. Sobretudo porque a multa para os infratores é de R$ 130,16. Além disso, o motorista recebe quatro pontos no prontuário. Bem como o veículo pode ficar retido para que o tempo de descanso seja cumprido.
? Assim, quem mais sofre são os caminhoneiros autônomos. Ou seja, como o preço do frete não acompanha a alta de custos do transporte, muitos acabam descumprindo a lei. Evidentemente, uma coisa não justifica a outra. Porém, ajuda a explicar.
+++ LEIA TAMBÉM: A fidelidade no varejo de combustível é mais do que apenas acumular pontos
+++ Cashback: a febre do “dinheiro de volta” no Brasil
Caminhoneiro autônomo
Assessor da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), Marlon Maues diz que é preciso contextualizar a situação. Ele lembra que o autônomo controla a carga horária. Por isso, pode acabar trabalhando além do que é seguro.
? Ou seja, as longas jornadas de trabalho estão relacionadas à lei da oferta e da procura. Assim, é grande o número de autônomos atuando para transportadoras. Ou seja, para ter retorno financeiro, ele precisa fazer muito mais viagens.
Mesmo porque, o caminhão do autônomo é, em geral, mais velho. Logo, ele tende a fazer os frete menos atraentes. E, portanto, de menor lucratividade.
Controle no Brasil e no exterior
“Portanto, se houvesse uma carga horária predefinida, seria possível controlar o tempo do motorista na direção”, diz Maues. Segundo o especialista, isso funciona em países da Europa e nos Estados Unidos, por exemplo.
⛔ Porém, ele lembra que esses caminhoneiros também utilizam veículos mais modernos que os que circulam no Brasil. Assim, são equipados com sistemas de telemetria. Ou seja, é mais fácil de fazer o controle.
Contudo, Maues diz que no Brasil isso também é possível. Nesse sentido, ele afirma que bastaria fazer um maior controle por meio do tacógrafo. Aliás, essa a ferramenta usada pela PRF para fiscalizar o cumprimento da lei.
DT-e facilita fiscalização
Seja como for, há outras soluções possíveis. Como por exemplo, a implementação do Documento Eletrônico de Transporte (DT-e). Bem como um programa de renovação de frota.
Assim, o Projeto de Lei que cria o DT-e já foi aprovado pela Câmera dos Deputados. Ou seja, todos os documentos do transporte rodoviário de carga ficam concentrados em um único arquivo eletrônico.
Portanto, o autônomo pode negociar o frete diretamente com o embarcador. Assim, não precisa mais de um agenciador ou transportador. Entretanto, Maues diz que esse tema ainda é controverso.
Risco ao autônomo
Segundo o especialista, a proposta prevê que o embarcador faça toda a administração do frete. “Não faz sentido quem contrata ter a gestão da cadeia”, diz Maues.
De acordo com ele, essa tarefa deve ser feita por representantes de classe. “Eles defendem a categoria e são isentos”, afirma.
Seja como for, a grande questão é o risco ao caminhoneiro autônomo. Nesse sentido, o motorista que fica mais de oito horas ao volante direto tem maior propensão a se envolver em acidentes. Segundo o diretor-administrativo da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) e especialista em medicina do tráfego, José Montal.
Profissão desgastante
Afinal, diz o médico, dirigir é estressante. Segundo ele, o motorista tem de ficar atento o tempo todo. Nesse sentido, a profissão é altamente desgastante.
“Se o motorista faz longas jornadas, sem parar para o descanso, perde a capacidade de manter a atenção” afirma o especialista.
Segundo ele, o risco aumenta muito no caso de motoristas profissionais.
Ou seja, a penalidade para quem não cumpre a lei pode ser muito maior que o valor da multa. Ou seja, pode comprometer seriamente a saúde.
Obesidade, hipertensão e diabetes
Diretor científico da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra), Alysson Coimbra diz que os impactos na saúde dos motoristas são comuns. “O cansaço, aliado à privação de sono, comprometem os reflexos”, afirma.
Segundo ele, uma das consequências é o surgimento de doenças metabólicas. Por exemplo, o médico cita obesidade, hipertensão e diabetes.
“Esses fatores somados reduzem a capacidade de dirigir com segurança”, afirma Coimbra. “E aumentam o risco de ocorrência de acidentes.”
+++ Chegou o Aplicativo de Checklists Inteligentes Brasil Postos
+++ Digitalize e Controle as Rotinas do Posto e da Conveniência – App Checklist Inteligentes Brasil Postos
Bons hábitos ajudam
Segundo os especialistas, os períodos de descanso contribuem com a qualidade de vida do motorista. Nesse sentido, agregar bons hábitos, como se alimentar bem, relaxar e fazer exercícios durante as paradas é extremamente saudável.
“Por exemplo, fazer alongamento e andar em torno do caminhão ajudam a evitar doenças relacionadas à circulação.” De acordo com ele, a dermatite é outra doença comum nesses profissionais.
Atualmente, o caminhoneiro autônomo roda, em média, 8,5 mil quilômetros por mês. Portanto, trabalha, em média, 11,5 horas por dia de cinco a sete dias por semana. De acordo com o estudo Perfil do Caminhoneiro, feito pela Confederação Nacional de Transportes (CNT) em 2019.
Atendimento focado no motorista
Assim, Coimbra reforça ser imprescindível que haja acompanhamento médico constante para a categoria. Bem como psicológico.
Segundo o estudo, apenas 42% dos caminhoneiros vão ao médico de forma preventiva. Além disso, 38,3% só procuram ajuda quando os sintomas de doenças aparecem ou pioram. E 5,7% só utilizam o ambulatório para atualizar o atestado de saúde.
Dessa forma, a Abramet propõe a criação de um serviço focado na medicina do tráfego. Essa rede faria parte do Sistema Único de Saúde (SUS).
Fator humano é a maior causa de acidentes
Segundo Montal, acidente de trânsito é um problema de saúde pública. “Por isso, a fiscalização da PRF é de extrema importância. Dessa forma, conseguimos medir a situação da categoria para desenvolver ações positivas.”
“A ciência mostra que 90% dos acidentes são provocados pelo fator humano. Se não cuidarmos adequadamente da saúde desses motoristas, as chances de eles morrerem e de outras pessoas morrerem nas estradas aumentam muito”, diz Coimbra.
Por isso, as entidades médicas foram contra a extensão do prazo de validade da CNH para até dez anos. “Quando a lei amplia o prazo para nova avaliação por especialistas em trânsito, contribui para o agravamento do quadro de saúde”, diz o especialista.
Fonte: Estadão