Acórdão do TJ-GO e liminar do TJ-PR aplicam o ccb e a lei antitruste nos contratos entre postos de gasolina e distribuidoras- contra a discriminação de preços e estipulação de quantidade mínima.
A Jurisprudência vem evoluindo no sentido de aplicar a Lei antitruste aos contratos entre postos de gasolina e distribuidoras.
Dentro deste cenário, em dezembro de 2021, em uma decisão emblemática e muito bem fundamentada, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás decidiu que a distribuidora não pode obrigar o posto a adquirir quantidade mínima de combustíveis sem que haja mercado para tanto, ficando assim ementado:
“Apelação Cível. Ação Declaratória de Quitação Contratual. Rescisão contratual. Contrato de cessão de uso de marca, fornecimento de produtos e outros pactos de posto de combustível”.
Obrigatoriedade de aquisição de quantidade mínima de combustíveis com exclusividade. Abusividade.
I – A boa-fé objetiva contratual se baseia na conduta das partes, que devem agir com correção e honestidade, correspondendo à confiança reciprocamente depositada.
II – Impor ao revendedor a obrigatoriedade de aquisição de litragem mínima de combustíveis, por mais de uma década, sem que exista mercado para tanto, sob pena de eternização do contrato, viola o princípio da boa-fé objetiva, razão pela qual deverá a correspondente cláusula ser considerada abusiva e nula de pleno direito. (TJGO 51910124320178090051-Relator: Des. Jeronymo Pedro Villas Boas- Pub: 14/12/2021).
Vejamos os fundamentos fortes trazidos ao acórdão pelo ilustre Desembargador relator:
“Analisando-se os fatos sob uma ótica mercadológica, poder-se-ia concluir pela legalidade dos ajustes, uma vez que a obrigatoriedade de aquisição, por parte do autor, de litragem mínima de combustíveis seria justificada pelos investimentos e benefícios concedidos pela parte ré, ora apelante.
Contudo, sob uma visão jurídica, parece evidente a abusividade da cláusula discutida nestes autos, mormente quando analisada conjuntamente com a cláusula 4, que prevê a prorrogação do pacto pelo tempo suficiente para a aquisição da quantidade de produtos se o prazo de vigência originalmente estabelecido não for suficiente para tanto. Neste toar, acertado o entendimento do julgador singular entendeu ser nula a exigência contratual de aquisição de uma quantidade mínima de combustíveis, bem como da cláusula que impõe multa pelo não cumprimento do volume estabelecido contratualmente.
Ora, a cláusula contratual em comento obriga a revendedora a, eventualmente, ter de adquirir combustíveis da requerida sem que haja a respectiva demanda um volume extraordinário do produto, ou seja, impõe uma aquisição de combustíveis forçada, sem que exista mercado de consumo para a absorção do produto. Tal exigência ofende claramente o princípio da boa-fé objetiva, insculpido no art. 422 do novo Código Civil, na medida em que autoriza um locupletamento indevido de um dos contratantes em detrimento do outro, que ficaria obrigado a adquirir um volume especificado de produtos ainda que contra sua vontade, com evidente prejuízo.” (g.n).
Esta também é a tese que entendemos deva ser aplicada em casos semelhantes, pois, não existe qualquer lógica que se estabeleça uma quantidade mínima em um contrato de adesão, de longa duração, de trato continuado, em produtos homogêneos, se já existe o prazo final (termo final) do contrato, sendo, portanto, uma cláusula ambígua.
Em caso guerreado, onde a distribuidora buscou cobrar a multa pela não aquisição da quantidade mínima no prazo contratual, o TJ-PR., aplicou o artigo 423 do C.C. (Apelação 16407822 PR 1640782-2), dando como terminado o contrato pelo prazo, independente do saldo do volume estabelecido ao aderente, no caso o posto.
Ademais, é teratológico, que a distribuidora exija a compra de uma quantidade mínima em um contrato onde o posto só pode comprar e sua contratante, por um de 5; 6; 7 ou 10 anos, sob pena de ao final do contrato, obrigar o posto a pagar uma multa milionária se não conseguiu comprar aquela quantidade mínima que estipulou.
Evidente, que se já estipulou um prazo no contrato, não há motivo para se estabelecer uma quantidade mínima de compra, se o posto só pode comprar da distribuidora contratante.
Exemplificando: para um posto médio com um contrato de 300.000 litros mês, por 5 anos, este posto terá que vender 18 milhões de litros, ou seja, em média 10 mil litros por dia, e assim:
1º) Considerando um posto pequeno, que é obrigado a comprar em média 10 mil litros dia, (300 mil litros mês), com 4 tanques de 15m3 instalado, então, só poderá estocar 60 mil litros no máximo, que corresponde a 6 dias de venda. Consequentemente, o volume de compras do posto, guarda a exata proporção de suas vendas, portanto, por óbvio não pode comprar mais do que vende.
2º) Considerando que o mercado, sofre variações, tais como, concorrência, greves, abertura de novos postos na área geográfica, discriminação de preços de sua distribuidora monopolista, desvio de tráfego etc…, além de projeção pela distribuidora acima do potencial do posto, logo, é fácil concluir:
a. Que não existe qualquer lógica comercial ou jurídica, estipular nestes contratos uma quantidade mínima de venda ao posto, sob pena de ao final do contrato, mesmo vencido pelo prazo, este posto esteja sujeito a pagar uma multa milionária, por não ter atingido aquela quantidade mínima. Vale lembrar que muitas vezes estas multas superam o patrimônio líquido do posto, além de afrontar o artigo 36 da Lei antitruste;
b. Que estas cláusulas que estabelecem quantidade mínima, são despidas de boa-fé, pois, não pode aquele posto comprar mais combustíveis do que o mercado suporta, tornando-se uma obrigação írrita e impossível de ser cumprida, subsumindo ao artigo 124 do Código Civil:
“Art. 124. Têm-se por inexistentes as condições impossíveis, quando resolutivas, e as de não fazer coisa impossível.”
c. Que esta obrigação de compra de quantidade mínima, vem sendo anulada pelo judiciário, pois, além de ser inserida nestes contratos sem qualquer lógica, fere ainda ao princípio da boa-fé contratual, além de afrontar o artigo 36, § 3º, IX da Lei antitruste.
Aplicando a Lei antitruste, o E. TJ-PR., em juízo não exauriente, cujos trechos foram extraídos do corpo da decisão prolatada pelo Des. Francisco de Paula Xavier Fernandes Guerra, que analisou a questão sobre a ótica do artigo 36, § 3º, IX, da Lei 12.529/2011, fazendo a subsunção da situação fática a norma, decidiu:
“(…) Tem-se que a distribuidora agravada vendeu combustíveis à agravante com valores distintos (maiores), ainda que a venda tenha se dado sob as mesmas condições (mesmos produtos, mesma data e mesmo local), prática comercial que constitui infração da ordem econômica, nos termos do art.36, § 3º, X, da Lei 12.529/2011: Frente a isso, presentes os requisitos autorizadores da concessão da liminar pleiteada, defiro o pedido de concessão de efeito ativo, com o fim de determinar à agravada, sob pena de multa diária de R$ 200,00 (duzentos reais) que, a partir da sua citação, passe a vender combustíveis à agravante, na forma como previsto na cláusula 4.1 do contrato firmado entre as partes, pelo preço que vende na base de distribuição de Cascavel, de forma a não discriminar a recorrente em relação aos demais postos..” (Gil Francisco de Paula Xavier Fernandes Guerra Des. Relator)
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O Advogado Antonio Fidelis é colunista do Blog do Portal e Academia Brasil Postos.
Sócio proprietário da Fidelis & Faustino Advogados Associados juntamente com seu filho Advogado Guilherme Faustino Fidelis OAB-PR-53532 e OAB-SP- OAB/SP 360.025, e sua esposa Advogada Sonia Regina Faustino – OAB-PR-8410. O seu escritório está localizado em Londrina-Pr., porém, em razão da tecnologia, processos eletrônicos e virtual, atua em todo o Brasil.
Foi Conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, Professor, Sargento da Reserva do Exército, trabalhou por 15 anos na Shell atendendo postos revendedores e grandes indústrias. Desde o ano 2000 prestar serviços advocatícios para os postos revendedores filiados ao Sindicato dos Postos Revendedores do Paraná- Paranapetro.
O seu Staff é especializado em direito empresarial, direito administrativo: CADE-ANP-PROCON. Ambiental: IBAMA e órgãos do meio ambiente. Contratos: Holdings, Falências, Recuperação Judicial, Revisionais, Renovatórias e toda a área de direito empresarial, especializado em Postos Revendedores de Combustíveis.
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