O grupo de trabalho formado na Fazenda concluiu que a liberação da venda direta de etanol por produtores para postos revendedores é positiva e recomenda que o governo edite uma medida provisória ou projeto de lei para adaptar a tributação. A mudança, que desagrada as grandes empresas do setor, tem apoio na ANP e no Cade.
“Nesse contexto, sugere-se a adoção de Medida Provisória (MP) ou projeto de lei (PL) com a proposição da elevação do teto legal das alíquotas da Contribuição para PIS/Pasep e da Cofins no elo da
produção, limitado, atualmente, ao valor de R$ 130,90 por metro cúbico”, concluiu o grupo de trabalho na Fazenda, do qual participaram também a ANP e o Ministério de Minas e Energia (MME).
Essa correção seria necessária porque atualmente a tributação federal fica distribuída entre produtores e distribuidores. O relatório da Fazenda, contudo, alerta que o tema precisa passar pelo Conselho de Política Fazendária (Confaz), que reúne os governos estaduais responsáveis pela cobrança do ICMS.
A venda direta hoje é vetada pela resolução 43/2009 da ANP que restringe a comercialização apenas às operações entre produtores, com as distribuidoras ou para exportação. A justificativa, à época, é a de garantir o abastecimento e concentrar as exigências de controle de qualidade dos combustíveis, aspectos que atualmente a ANP entende que não dependem mais desse monopólio das distribuidoras.
Em dezembro, a ANP concluiu no relatório da Tomada Pública de Contribuições (TCP) criada para tratar do tema, que o obstáculo da venda direta do etanol, por produtores, para postos de combustíveis, são as distorções que podem ser causadas no mercado com a cobrança de ICMS e PIS/Cofins – tema, agora, abordado pela Fazenda. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) também é favorável à mudança, pelo aumento da competição e redução de custos na cadeia.
Ganhou força no Congresso – A discussão sobre a venda direta do etanol ganhou força este ano, depois que projetos autorizando a mudança ganharam velocidade, mesmo com a resistência do inicial do governo Temer. O tema encontrou apoio na Câmara e no Senado, inclusive entre parlamentares da base, em especial no contexto da greve dos caminhoneiros. A venda direta começou como uma pauta de usineiros do Norte e Nordeste, em especial de Alagoas, Sergipe e Pernambuco.
Em junho, o Senado aprovou em regime de urgência o projeto (PDC 978/2018) do senador Otto Alencar (PSD/BA), que seguiu para a Câmara onde outros textos tramitam com o objetivo de liberar a venda direta – PL 10316/2018, do deputado Mendonça Filho (DEM/PE) e PL 10406/2018, do deputado Professor Victório Galli (PSL/MT).
De lá para cá, por meio de audiências públicas e dos grupos de trabalho formados com Fazenda, ANP e MME e, inclusive, de uma decisão judicial que liberou a venda em estados do Nordeste, o tema tem ganhado cada vez mais força.
Em dezembro, o vice-presidente Hamilton Mourão chegou a receber representantes de associações de usineiros favoráveis à venda direta, em um encontro pelo deputado federal eleito General Girão (PSL-RN), a pedido da Associação dos Plantadores de Cana do Rio Grande do Norte, em que participaram a ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM/MT) e o de Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes – Cristina, por sinal, foi uma indicação de setores do agronegócio brasileiro, círculo que reúne grandes empresas que preferem manter o monopólio da distribuição do etanol.
Participaram do encontro Alexandre Lima e José Ricardo da Federação dos Plantadores de Cana do Brasil (Feplana); Renato Cunha e Pedro Robério, respectivamente, dos Sindicatos do Açúcar e do Álcool de Pernambuco e de Alagoas; Bráulio Galvão e Frederico Pessoa de Queiroz, da União Nordestina dos Plantadores de Cana; e Plínio Nastari, consultor da Datagro e membro do CNPE, reconduzido este mês por mais dois anos. Com exceção de Nastari, o grupo que encontrou os ministros indicados e Mourão é o mesmo que lidera a defesa pela venda direta.
Fidelização das bandeiras – A Fazenda também cita que os efeitos da venda direta no aumento da concorrência podem ser maiores com o fim da fidelização dos postos varejistas. Ainda que resolvida a questão dos tributos, da forma como está hoje a venda direta apenas ocorreria com os postos bandeira branca. A ANP já analisa o tema, por meio de uma TCP aberta em setembro do ano passado e que está em fase de conclusão dos relatórios.
Divergência no impacto logístico – A Plural, associação que reúne as grandes distribuidoras, apresentou à Fazenda um estudo de impacto logístico contratado com a Leggio que ponta para um aumento de 24,7% nos custos logísticos do etanol, com perdas da ordem de R$ 181 milhões. Fala também do impacto no óleo diesel B e gasolina C (R$ 252 milhões) e no etanol anidro no trajeto entre usina e as bases de distribuição (R$ 34 milhões) e substituição do transporte por bitrem (44 m³) para caminhão tanque (30m³).
No relatório, a Fazenda ressalta que o estudo considera que toda a comercialização de etanol passaria a ser feita na nova regra e ignora “o caráter facultativo da medida e a diversidade de arranjos contratuais e logísticos que podem surgir”. Afirma também que “o trabalho da Leggio não detalha as funções matemáticas de custo
empregadas, tão pouco as premissas de preço do etanol utilizadas e o tratamento dos dados implementados”.
O relatório cita outro estudo, feito em 2015 na Escola de Engenharia da USP, por Mateus Brito Gama, que compara as distâncias percorridas em São Paulo nos trajetos entre usina, base das distribuidoras e municípios e o frete direto entre usinas e os municípios.
Conclui, com dados de preços e movimentações de 2012, que seria possível uma redução de 47% no custo logístico total, da ordem de R$ 263,5 milhões por ano, em São Paulo. Além da redução positiva na emissão de gases do efeito estufa. “A viabilidade da entrega direta depende de novas estruturas de armazenagem e controle de qualidade nas usinas, envolvendo investimentos da ordem de R$ 126 milhões, o que pode resultar em ganho econômico de R$ 137 milhões”, destaca o relatório da Fazenda.
Fonte: https://epbr.com.br