Rodrigo Zingales é advogado e mestre em economia, especializado em regulação e direito da concorrência.
É atualmente Diretor Executivo da ABRILIVRE e explica em maiores detalhes os do setor de combustíveis no Brasil em entrevista concedida com exclusividade ao Blog do Portal Brasil Postos.
1 – O que é a Abrilivre ? A AbriLivre é uma associação privada e sem fins lucrativos, constituída em março de 2019 com o objetivo de defender os interesses dos revendedores de combustíveis, garantindo-lhes, especialmente os pequenos e médios revendedores, condições competitivas para exercerem o seu direito à livre iniciativa e à livre concorrência.
2 – A ABRILIVRE recebe alguma ajuda governamental ? Não. Somos integralmente financiados por nossos Associados, que pagam uma taxa mensal de R$ 300,00 para o primeiro posto do mesmo “grupo econômico” e R$ 150,00 aos demais.
Criamos ainda uma vaquinha virtual (https://www.vakinha.com.br/vaquinha/abrilivre-acoes) para receber doações de revendedores, parceiros e pessoas que acreditam em nossas bandeiras e querem nos ajudar a trazer ao mercado de combustíveis maior concorrência e competitividade aos pequenos e médios empresários, em especial.
3 – Como a AbriLivre funciona? R: O nosso Estatuto (https://abrilivre.org.br/transparencia/) foi desenhado para termos em nossa associação uma estrutura de governança moderna, onde os Associados possuem voz e plenos poderes para dirimir e definir as ações e rumos da ABRILIVRE. Nessa estrutura, a Assembleia Geral, formada por todos os associados, é o órgão máximo que define e determina as ações a serem tomadas pela Associação.
Há ainda os Conselhos de Administração e Ética, formados por associados eleitos e não remunerados, com mandato de dois anos e sem direito a recondução, à exceção do primeiro ano da Associação, considerado pelo Estatuto como de “Período de Transição”.
O dia a dia da Associação é organizado e gerido pela Diretoria, formada por profissionais da área remunerados e sem qualquer vínculo direto ou indireto com o negócio de revenda ou qualquer outro relacionado a ele.
Formamos ainda grupos de trabalho que contam com a participação da Diretoria, dos membros do Conselho e de qualquer Associado com o objetivo de ser um fórum de discussões de temas de relevância para a revenda.
Nesta semana, por exemplo, foi definida a criação de Grupo de Trabalho para debater e pensar os problemas e soluções para melhoria nas condições competitivas e negócios dos revendedores sem bandeira, os quais muitas vezes acabam sendo marginalizados pela opinião pública e até mesmo pelos órgãos de governo. No passado fizemos o mesmo para os postos bandeirados e hoje já estamos implementando as ações ali discutidas e decididas para lhes garantir maior competitividade e preços mais baixos a seus clientes.
4 – Na última quarta-feira foi ao ar no Jornal da Band reportagem que mostra que os postos não seriam os responsáveis pelos preços altos nas bombas.
Poderia em poucas palavras explicar o que exatamente ocorre nessa relação distribuidora – revendedor? Realmente, foi a primeira vez que um veículo de televisão de apelo nacional teve a coragem de levar ao ar matéria que mostra, de forma nua e crua, o que acontece nessa relação entre distribuidoras bandeiradas e revendedores de combustíveis.
Por isso emitimos a Nota de Agradecimento à Rede Bandeirantes que pode ser acessada no vídeo abaixo.
Tentando encurtar uma longa estória, o que acontece no setor é:
(1) existe uma regulação da ANP (chamada de Tutela do Embandeiramento) que obriga o revendedor que ostenta a marca de uma distribuidora específica a apenas comprar combustíveis desta distribuidora;
(2) aproveitando-se dessa Tutela do Embandeiramento e do poder de mercado que as principais distribuidoras do país obtiveram ao longo das últimas décadas, estas acabam padronizando seus contratos com cláusulas absolutamente abusivas e leoninas e de longo prazo.
Essa relação contratual absolutamente desequilibrada obriga a maioria dos revendedores ligados a essas distribuidoras a pagar preços mais elevados pelo combustível – pois os contratos não trazem qualquer previsão sobre a constituição do preço a ser pago pelo combustível contratado – e a não poderem ir ao mercado comprar de outras distribuidoras que ofertam os mesmos combustíveis a preços mais baixos, exatamente porque esses contratos preveem exclusividade e multas rescisórias elevadíssimas e praticamente impagáveis.
As principais distribuidoras bandeiradas do país ainda adotam políticas comerciais uniformes, baseadas na discriminação de preços entre postos de suas respectivas redes e, até mesmo, entre postos de sua rede e sem bandeira.
Não é incomum encontrarmos postos ligados à mesma bandeira e localizados na mesma região pagando pelo mesmo combustível preços com diferenças de até R$ 0,50.
O mesmo em relação a preços cobrados pelas distribuidoras bandeiradas dos postos ligados a sua bandeira e postos sem bandeira, sendo que nesse caso, esses últimos é que são os beneficiados, distorcendo por completo a lógica econômica de o posto se bandeirar.
+++ Prática de distribuidoras impõe preço final da gasolina – Assista ao vídeo
E aqui está o grande problema apontado corretamente na reportagem da TV Bandeirantes: se uma distribuidora bandeirada cobra do Posto A R$ 5,00; do Posto B R$ 4,80 e do Posto C R$ 5,20 pelo mesmo litro da gasolina, fica claro que está fazendo isso para beneficiar o posto B, em detrimento dos demais postos; e, ainda, estará controlando o preço que os postos cobrarão dos consumidores finais. Afinal, o Posto A não poderá cobrar menos de R$ 5,00, assim como o Posto C não poderá cobrar menos de R$ 5,20, levando o preço de mercado para, no mínimo, este último valor.
Se as distribuidoras praticassem o mesmo preço de R$ 4,80 para todos os postos de sua rede, os postos teriam maior liberdade para decidir se venderiam a gasolina a seus clientes por R$ 4,80, R$ 5,00 ou R$ 5,20.
Lembrando que se o preço de compra fosse R$ 4,80 para todos, em cima desse preço há ainda todos os custos inerentes à operação do posto: folha de pagamento, aluguel, água, luz, impostos etc., os quais a cada dia estão mais altos e que influenciam na elevação dos preços para os consumidores finais.
5 – Qual(is) medida(s) a AbriLivre já realizou ou pretende realizar para tentar resolver este problema existente no segmento de distribuição – revenda? Além de já termos apresentado esse problema, com toda a documentação e dados que comprovam o que falamos, aos representantes de ANP, Ministério de Minas e Energia, Ministério da Economia, CADE, SENACON e PROCONs Estaduais e Municipais, além de parlamentares, pretendemos insistir na Agenda Regulatória da ANP 2020/2021 sobre a necessidade iminente de:
(1) revogação da atual Tutela do Embandeiramento;
(2) da revogação das restrições regulatórias à venda e à compra direta de etanol, gasolina e diesel por parte dos revendedores; e
(3) edição de norma que regule os contratos de exclusividade de forma a ter absoluta publicidade e transparência nos preços cobrados pelos combustíveis fornecidos pelas distribuidoras aos postos e em suas políticas de descontos de forma a garantir tratamento isonômico a todos os revendedores bandeirados e sem bandeira, em moldes similares àqueles dos contratos celebrados entre distribuidoras, refinarias, usinas e importadores de combustíveis (Resolução ANP 795/19 – https://atosoficiais.com.br/anp/resolucao-n-795-2019-dispoe-sobre-a-obrigatoriedade-de-apresentacao-de-dados-de-precos-relativos-a-comercializacao-de-derivados-de-petroleo-e-biocombustiveis-por-produtores-importadores-e-distribuidores-e-da-outras-providencias?origin=instituicao&q=795).
Pretendemos ainda insistir com a realização da audiência pública, aprovada pela Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, em dezembro de 2019 (https://abrilivre.org.br/wp-content/uploads/2021/01/3.-REQ-134-2019-CME.pdf), onde as principais distribuidoras bandeiradas do país, a ANP, o CADE e representantes nacionais de revendedores deverão ser convidados para expor e debater sobre este problema de preços e políticas comerciais discriminatórias. Esperamos, sinceramente, que esta audiência ocorra logo para que tudo isso seja colocado às claras e devidamente esclarecido pelos respectivos responsáveis.
Estamos ainda avaliando internamente outras medidas administrativas, judiciais e até mesmo legislativas para tentar resolver, de uma vez por todas, este problema da discriminação de preços e do controle do preço na bomba pelas principais distribuidoras bandeiradas do país.
6 – Na primeira resposta, você falou na criação pela AbriLivre de um Grupo de Trabalho para discutir e tentar solucionar os problemas dos postos sem bandeira. Quem poderá participar e o que exatamente seriam esses problemas? Pretendemos abrir este Grupo de Trabalho para os nossos associados e qualquer interessado em debater e pensar em soluções sobre os principais problemas enfrentados pelos postos sem bandeira.
O Grupo servirá exatamente para apresentar e discutir esses problemas. No entanto, na minha visão pessoal, acredito que deverão entrar na pauta do grupo pelo menos dois temas associados:
(a) a qualidade dos combustíveis comercializados por postos bandeirados e sem bandeira, o que em tese não existe se o posto adquire combustível da mesma distribuidora ou base e não o adultera;
(b) a adoção de medidas mais efetivas de fiscalização e punição de distribuidoras e postos que adulteram combustíveis ou fraudam bombas;
(c) a uma maior transparência por parte dos órgãos de fiscalização sobre o real número de distribuidoras e postos que cometem irregularidades, inclusive, com a cassação imediata de suas licenças de funcionamento.
Fonte: Brasil Postos
Assista ao vídeo e conheça essa ferramenta para controlar as compras e os prestadores de serviços no dia a dia dos seus postos de combustíveis e lojas de conveniência?