A rotina de quem percorre as estradas brasileiras é agitada, difícil e depende de alguns obstáculos a serem diariamente superados.
Os pontos de parada são alguns dos maiores, mas não deveriam ser.
Somente aqueles que têm a visão da estrada da parte de dentro da cabine tem noção do quanto esse trabalho pode ser estressante, cansativo e difícil em muitos momentos. Para uma qualidade e segurança no trabalho, os motoristas que percorrem longas distâncias estão sujeitos a leis que determinam o limite de horas viajadas em relação ao tempo adequado de descanso.
Para atender essa necessidade, pontos de parada distribuídos ao longo das estradas servem para que os motoristas possam descansar, se alimentar, tomar um banho e seguir viagem. Eventualmente esses postos de atendimento para o caminhoneiro são grandes aliados durante as viagens, pois equilibram a intensidade da rotina com o tempo de descanso, sem falar na possibilidade de se encontrar com colegas de profissão, fazer amizades e até conseguir novos negócios.
Passar longos períodos longe de casa é bem difícil, e por mais que seja uma profissão adorada, a saudade é um fator que pesa durante o percurso. Ainda que a vontade maior seja finalizar o serviço e voltar para a casa, sempre com muito orgulho do trabalho, a falta de descanso pode prejudicar a saúde e aumentar os riscos de acidentes.
O ponto é que isso bate de frente com uma questão fundamental: O Brasil possui pontos de parada adequados para que os caminhoneiros possam descansar, se alimentar e seguir viagem tranquilamente depois? Antes de prosseguir, é interessante entender o que são pontos de parada e sua relação com a Lei do Caminhoneiro.
Por que as paradas são importantes?
Mencionada na Lei de Descanso para Caminhoneiros, a parada é essencial para preservar, acima de tudo, a segurança do motorista e de todas as pessoas nas rodovias do País. A Lei de Descanso para Caminhoneiros foi criada com o intuito de preservar a saúde e a segurança dos motoristas levando em consideração o fato de executarem uma atividade de alto risco.
A lei foi sancionada por conta dos acidentes causados principalmente por essas longas jornadas nas estradas, que também eram adequadamente justificadas pelos prazos e cronogramas apertados eventualmente aplicados aos motoristas.
Apesar de ser essencial, muitos motoristas reclamam das cobranças de pernoite e taxas para utilização do chuveiro aplicadas a todos que utilizarem o local que ocorrem em boa parte dos pontos de parada. Em geral, não existe a possibilidade destes serviços serem gratuitos, e são condicionados ao caminhoneiro abastecer no posto.
Os postos de atendimento são locais que devem ajudar o caminhoneiro nessa vida de estradas, e por isso, ao mesmo tempo que o estado determina a obrigatoriedade do descanso, o que é correto considerando a segurança do motorista principalmente, também é correto dizer que os locais de parada devem ser garantidos. Para isso, precisamos saber um pouco mais sobre a Lei do Caminhoneiro também.
Entendendo a Lei do Caminhoneiro
Os pontos de parada e descanso estão previstos na Lei 13.103/15, também conhecida como a Lei do Caminhoneiro. Esses locais, posicionados próximos ou na beira das rodovias, são dedicados aos motoristas que desejam esperar ou descansar antes de seguir viagem, uma reivindicação antiga principalmente para os caminhoneiros autônomos que normalmente dependem do próprio bolso para se manter ao longo do percurso.
Sendo assim, de acordo com a mesma lei, o profissional ligado ao transporte rodoviário de passageiros ou de cargas não pode dirigir por mais de 5 horas e meia seguidas, sendo necessário ter um intervalo de 30 minutos após este tempo.
Ou seja, a cada 6 horas de trabalho, por lei o motorista deve usar 30 minutos para descansar.
Porém se no papel existe um cenário ideal e seguro, a realidade cria situações contraditórias. O Brasil é enorme, e existem muitas diferenças entre as regiões. O fato é que todos os locais dependem do transporte rodoviário de carga para o abastecimento de alimentos, remédios, roupas e acessórios, no entanto, enquanto algumas regiões possuem pontos adequados de parada, outras não contam com a mesma estrutura.
Como consequência dessa falta de infraestrutura, muitos motoristas não têm a opção de parar para descansar e acabam seguindo viagem além do recomendado, o que aumenta o risco de acidentes causados pelo cansaço e sono. Apesar da lei existir desde 2012, ela só foi regulamentada em 2020, quando estabelecimentos passaram a ser credenciados pela Secretaria Nacional de Transportes Terrestres (SNTT) como uma medida para que esses locais cumpram regras de higiene, segurança e conforto aos motoristas.
Como melhorar a estrutura dos pontos de descanso?
O impacto que toda essa falta de estrutura traz é sentido diretamente por quem deveria, de acordo com a lei, ser o maior beneficiado disso: o caminhoneiro. Sendo assim, ninguém melhor que os próprios motoristas para nos passar uma visão realista sobre os pontos de parada nas estradas.
Aposentado há 5 anos, José Barbosa continua trabalhando como caminhoneiro e já completou 40 anos realizando o transporte de carga frigorífica. O motorista, que costuma trafegar pelas regiões do nordeste do Brasil falou o seguinte sobre os pontos de parada das regiões por onde passa:
“Não tem. Nos lugares tenho que pagar 10 reais para conseguir tomar banho. Estamos mais judiados que cachorro” .
Barbosa destacou também alguns dos perigos encontrados nos pontos de parada: “É difícil, não tem estrutura. Mesmo em lugar para parar é só ladrão. Se para o caminhão na rua já desligam um fio do caminhão”.
Aqui o caminhoneiro desabafou sobre uma tática usada para roubar motoristas. Ao percorrer uma certa distância e perceber o problema no caminhão, o motorista alvo deste golpe é surpreendido pelos bandidos ao parar o veículo durante o percurso para verificar o problema.
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José Osvaldo Alves Ribeiro trabalha com caminhões e ônibus há 15 anos, passando por motorista de ônibus, de caminhão de coleta e mais recentemente, há cerca de 1 ano e meio, trabalha como motorista na Abima Transportes.
Responsável por cargas de frascos, Osvaldo percorre em média 200 km por dia, passando por principais pontos de São Paulo como Embe e Guarulhos. “Eu fico mais nesse ponto de descanso aqui, que tem banheiro e restaurante. A única questão é que para usar é preciso abastecer aqui, mas geralmente todos os postos são assim, né?! Você precisa abastecer para usar a estrutura”, destacou.
Kenya Martins Fehlauer é motorista há 6 anos, mas a vida de caminhoneiro está no seu sangue. Filha de pai e mãe caminhoneiros, Kenya cresceu dentro de um caminhão, e agora roda as estradas do país no comando do seu caminhão. Funcionária da Costa Teixeira Transportes, a caminhoneira percorre todo o território nacional transportando embalagens, bobinas, mdf e outros itens similares.
Percorrendo entre 500 e 800 km por dia, a motorista destaca as diferenças entre os pontos de parada em algumas regiões do Brasil: “Então, alguns postos são muito bons, até bons demais, mas a grande maioria ainda falta recursos como um bom banheiro, limpo de preferência, lugares que tenham alguma sombra para serem feitas as refeições. Principalmente, para nós mulheres, ainda falta estrutura em relação aos banheiros. No Sul os lugares costumam ser mais organizados e com mais recursos, mas de Minas para cima, o negócio já fica esquisito. É bem complicado!”, afirma a caminhoneira.
Ricardo Silva é motorista desde 2006. e realiza o transporte de cargas líquidas, Ricardo aponta algumas dificuldades encontradas ao longo do caminho. “Hoje, por exemplo, vim de Santos para São Paulo e precisei sair do Rodoanel e fazer o retorno para vir almoçar aqui. Nele tem pontos de parada também, mas não tinha almoço na rota que fiz”.
Embora a lei aponte de maneira explícita sua exigência por questões de segurança, a pergunta que fica no ar é: o descanso é fundamental e entendemos que sem ele o motorista coloca sua própria vida em risco. Mas, diante de tantas dificuldades e falta de infraestrutura, quem está errado de verdade? O estado, por exigir algo e não fornecer a estrutura para tal, ou o motorista, que sem alternativa, segue viagem ultrapassando o tempo de descanso?
Fonte: Revista Caminhoneiro
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