Feche os olhos e imagine um setor do varejo extremamente pulverizado, com baixa integração digital, margens apertadas, carentes de gestão, com pouca eficiência operacional, sofrendo com a fragilidade econômica e confiança do consumidor. Abra os olhos e você estará dentro de um posto de combustível.
Desde o fim da greve dos caminhoneiros, temos feito um exercício com previsões de como a revenda de combustíveis se comportará nos próximos anos.
Novos players internacionais, fusões e consolidação do mercado, venda direta de etanol da usina para o posto, verticalização, autosserviço, crescimento de operações bandeira branca, novas tecnologias de carregamento elétrico e a reformulação do papel dos principais agentes da cadeia de distribuição foram listados como tendências e movimentações do setor de revenda de combustíveis. Com o passar dos meses, as previsões estão se consolidando e em ritmo acelerado.
Fim do modelo atual dos postos de combustíveis? Calma! Ainda não. Fato é que os 40 mil postos de combustíveis são, em sua maioria (70%) pequenos negócios especializados apenas na venda de combustíveis.
Como características principais são negócios familiares, com mais de 20 anos de existência (50%) e com baixíssimo uso de tecnologias de gestão ( digitalização ), sendo um negócio fundamentado na localização e no relacionamento pessoal do dono do posto com seus clientes.
A revenda de combustíveis nacional é formada 40.021 postos, segundo anuário estatístico da ANP de 2018. Destes, 47,6% são bandeiras brancas; 17,8% pertencem à BR Distribuidora; 14,6% à Ipiranga; 12,6% à Raízen; e 2,8% à Alesat. Daí a importância das
distribuidoras regionais em focar transferir gestão para sua base de postos sob pena de ver o seu cliente de desaparecer. Dramatizando ainda mais este cenário, sofrem com capital de giro limitado e falta de espaço para novas operações como loja de conveniência, troca de óleo ou lavação. A ineficiência no gerenciamento do posto impacta nos resultados e manter o fluxo de caixa equilibrado é um desafio constante.
Com a transformação acelerada dos modelos e formas de consumo, fica cada vez mais claro que esse modelo de negócio, do posto de gasolina, da forma como é hoje, está com os dias contados.
Porém, em todo cenário de transformação, existem oportunidades de negócio.
Neste caso, existem claras oportunidades para toda a operação de revenda de combustíveis – para as distribuidoras, para os consumidores e até para os próprios donos de negócio.
A expansão do posto de serviços além da venda unicamente de combustíveis
Os novos modelos de operação no país e, principalmente no exterior estão se movimentando rapidamente na diversificação de serviços buscando atender o cliente cada vez mais digitalizado e que busca conveniência e níveis de serviço cada vez maiores.
Muitas redes de postos têm buscado seu reposicionamento, incluindo a modernização da marca, a transformação visual dos postos, o lançamento de novos serviços, a ampliação dos canais digitais e a inauguração de novas operações de lojas de conveniência de acordo com o perfil dos moradores do bairro.
Esse novo formato de loja, mais próximo de seus clientes, tem um papel estratégico importante para sua proposta de se tornar uma plataforma de soluções e serviços para atender esse cliente cada vez mais exigente que busca ter suas necessidades atendidas em um só lugar evitando deslocamentos desnecessários.
Espaço de Conveniência Multifuncional
Diferente do perfil dos postos de combustíveis tradicionais, os espaços de conveniência multifuncional ( novo conceito ) têm a oportunidade de integrar uma grande oferta de serviços, por meio de integração com outros prestadores de serviços como lavanderias, co-work, barbearias, farmácias, restaurantes, etc. O grande diferencial é que estes novos parceiros podem contar com o suporte de atendimento do próprio posto que oferece segurança, atendimento 24 horas e, principalmente, está localizado nas melhores esquinas das cidades.
Que outro estabelecimento comercial hoje pode oferecer soluções como essas?
Já as principais distribuidoras têm ampliado ainda mais sua atuação no mercado de conveniência multifuncional ao ofertar serviços como lockers para entrega de encomenda, programas para atrair motoristas de aplicativos, venda de combustíveis por aplicativos, drive-thru para lojas de conveniência entre outras facilidades que agregam valor e aumentam o fluxo do posto. Os aplicativos de descontos no valor dos combustíveis, programas de fidelidade e programas de caschback ampliam a área de influência e a possibilidade de novas vendas atraindo clientes de outros bairros.
Os novos modelos de loja de conveniência estão cada vez mais maduros em postos de combustíveis, suportado por novos conceitos que deixam de lado o formato tradicional de mercearia e venda de fast food de baixa qualidade e muitas calorias para operações muito bem estruturadas de venda de bebidas importadas, padarias, food service, chegando a gourmetização de alguns pontos de vendas, com a venda de sushi e comida vegana, por exemplo.
Esses movimentos dos novos Espaços de Conveniência Multifuncional ampliam sua área de influência, que antes era restrita à venda unicamente de combustíveis e permitem a concorrência com centros comerciais e hipermercados, por exemplo.
Novo papel da revenda de combustível
Movimentos recentes da venda de combustíveis por aplicativos nos Estados Unidos mostram que os consumidores esperam muito mais dos postos de combustíveis do que apenas combustível barato e de qualidade.
A Booster Fuels, uma das pioneiras da venda combustível por aplicativo tem ampliado a oferta de serviços para seus clientes e, além do venda do combustível, ela também rastreia o consumo de combustível da frota de seus clientes. Os serviços de manutenção de pneus oferecidos para os clientes frotistas incluem verificação de pressão, bem como verificação de estado de cada pneu indicando a necessidade de rodízio e de trocas além do acompanhamento do nível de óleo lubrificante de cada veículo. De acordo com o seu fundador Tyler Raugh: “na Booster somos capazes de fornecer combustível de qualidade às frotas sem aumentar as despesas e, de fato, somos capazes de ajudar as frotas a economizar 20% ou mais em suas despesas totais de combustível “.
Algum revendedor de combustíveis já pensou em oferecer alguma solução que reduza o consumo de combustíveis de seus clientes? Acredito que não.
O papel da Distribuidora
Atuando nas oportunidades que existem no varejo do setor de combustíveis, as distribuidoras deveriam oferecer aos seus clientes consultoria e apoio na gestão do negócio, programa de capacitação para o time de posto, orientação e definição de mix de produtos e serviços e informatização da operação. Não por acaso são as principais dores dos donos de postos de combustíveis. Porém a realidade é que o relacionamento entre os postos revendedores e as distribuidoras se baseiam unicamente nos contratos de preço e volume.
Assim como algumas indústrias já enxergaram a oportunidade de estar mais próximas dos seus clientes, o mesmo deve acontecer com as distribuidoras de combustíveis. O tempo em que as margens eram altas e escondia as ineficiências da operação já passou. Nos últimos 10 anos, a margem média da revenda caiu 40%. Em 2008 era de 14% e, em 2018,
chegou a 10%. Hoje, a oferta das distribuidoras deve ir além dos combustíveis. Neste momento que estamos saindo de um forte período recessivo, as operações devem rever seu papel. Saindo de operadores logísticos e distribuidores para provedores de soluções e gestão para o revendedor.
Os postos de combustíveis não precisam de mais um distribuidor de produtos. Como descrito no início deste artigo, sua necessidade passa por um apoio na gestão e na operação do seu negócio.
Esse papel pode e deve ser olhado pelos distribuidores como uma grande oportunidade de fortalecer sua atuação na cadeia e gerar valor tanto para os revendedores como para o consumidor final.
Os principais agentes da cadeia da revenda de combustíveis composta por distribuidoras e redes de postos têm a oportunidade de repensar seus papéis e ambições e se tornarem protagonistas da transformação de todo o setor de revenda de combustíveis do país.
Escrito por Renato da Silveira.
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