O desafio para ambos é o de construir relações completas, capazes de gerar desejo, mas também com boa apresentação e entrega no momento da compra.
Os tempos mudaram. O consumidor de hoje não é mais o mesmo que freqüentava o varejo há dez anos atrás. As compras regradas, realizadas uma vez ao mês no supermercado com os melhores preços, renderam-se às visitas mais freqüentes, motivadas por compras de reposição. Ao lado da evolução da situação econômica do brasileiro, o tempo, artigo cada vez mais escasso na vida das pessoas, é um dos fatores que mais influenciaram a mudança de comportamento. Mas na era da conveniência, quem ganha na preferência do consumidor, as marcas da indústria ou as marcas do varejo?
Para responder a esta questão, é necessário antes de tudo avaliar a forma como o shopper se relaciona com cada marca. Especificamente com relação às marcas do varejo, o relacionamento hoje é bastante freqüente, motivado pelas compras de reposição. Paralelamente, a falta de tempo leva as pessoas a freqüentarem sempre os mesmos varejos, ou seja, aqueles mais próximos da residência ou do trabalho. Nesta regularidade, as possibilidades de criação de vínculos são enormes, uma vez que essas lojas passam a fazer parte da vida do consumidor.
Porém, de acordo com o último ranking divulgado pela consultoria Interbrands, das dez marcas preferidas pelo consumidor, sete delas são marcas da indústria, ao lado de três instituições financeiras. Entre as marcas da indústria, os brasileiros não abrem mão da Petrobrás, Skol, Natura, Brahma, Vale, Antártica e Vivo.
As vantagens da indústria na criação de relacionamentos com o consumidor são inúmeras. Em princípio, uma marca da indústria quase sempre está relacionada a uma aspiração e mexe com os desejos mais profundos do consumidor. O trabalho de relacionamento feito pela indústria passa pelo envolvimento de valores comuns com as pessoas, o que cria laços emocionais fortes e bastante relevantes.
No entanto, a comunicação da indústria, que se inicia na televisão, nas redes sociais, na mídia de forma geral, com o objetivo de fortalecer conceitos da marca e gerar desejo de compra, necessita da entrega no ponto de venda para ser concretizada. E aí está o primeiro ponto negativo na preferência do consumidor pelas marcas da indústria. Isso por que a indústria fica refém do varejo na forma como seus produtos serão expostos. Ela precisa que o varejo entenda suas necessidades e a promessa feita, para que o consumidor encontre esses fatores no momento da compra. Mas raramente é assim. Na prática, vemos que o varejo, no domínio da situação, pode não cumprir o acordado, em termos de destaque e exposição, e colocar a perder toda a comunicação feita pela indústria.
Com o crescimento de alternativas tecnológicas, como as compras pela Internet, a indústria também pode investir em vendas diretas, com interações mais próximas do consumidor. No entanto, o fato é que a presença no varejo é constante, de subsistência, enquanto o ciclo da indústria demanda maior esforço. O resultado é que esta relação pende cada vez mais para o varejista.
De formas diferentes, podemos ser mais fiéis às marcas da indústria ou do varejo, dependendo de nossa conveniência. Isso significa que temos marcas da indústria das quais não abrimos mão, como Coca-Cola, Omo ou Skol, por exemplo, cuja falta em um estabelecimento pode nos impulsionar a outros varejos. No entanto, de forma quantitativa, a grande maioria das marcas da indústria, que não têm uma relação intensa com o consumidor, pode ser substituída facilmente na lista de compras, em troca da praticidade de comprar tudo no mesmo local que o consumidor já freqüenta.
Nesta batalha pela conquista do consumidor, sairá na frente quem souber se adaptar à nova realidade. Com menores intervalos entre as gerações, com características cada vez mais distintas e individualizadas, não se fala mais em publico alvo e sim em indivíduo. O poder do varejista aumentará no momento em que ele dominar as ferramentas de marketing e mídia social e passar a utilizá-la em seu favor, na criação de vínculos emocionais. Mais forte em áreas de Marketing e Shopper Marketing, a tendência é que passe a ser menos dependente da indústria, crie mais e mais marcas próprias e se fortaleça.
Já à indústria, o cenário tende a fortalecer os relacionamentos personalizados. Proporcionar experiências memoráveis ao consumidor pode garantir a preferência e o encantamento do público. Um bom exemplo é a iniciativa da Ambev na criação de bares temáticos, onde pode dar ao varejista um exemplo prático de experiência de marca, diminuindo um pouco essa dependência direta do varejo.
O consumidor brasileiro, o que mais compra por impulso no mundo, tem uma certa tendência à “promiscuidade”. Mas, ao mesmo tempo em que gosta de experimentar novidades, pode ser cativado por uma relação que lhe passe confiança. O desafio, tanto para indústria quanto para o varejo, é o de construir relações completas, capazes de gerar desejo, mas também com uma boa apresentação e entrega no momento da compra.
*Leonardo Lanzetta é sócio e diretor-executivo da DIA Comunicação e VP de Agências do POPAI Brasil